Bertold Brecht - Aos que virão depois de nós

O teatrólogo e poeta alemão, Bertold Brecht é figura controversa no meio intelectual. Herói para muitos, vilão para alguns. O fato é que viveu o conturbado período da ascensão e cristalização do nazismo no poder. Seu poema Aos que virão depois de nós, parece que foi escrito para o que estamos vivendo no Brasil nesses tempos sombrios. Segue o poema nas vozes de Jeter Neveberg e Rodrigo Lerzog.

Bertold Brecht - Aos que virão depois de nós

Realmente, vivemos tempos muito sombrios!
Uma linguagem sem malícia é sinal de estupidez,
Uma testa sem rugas é sinal de indiferença.
Aquele que continua rindo é porque ainda não recebeu a terrível notícia.

Que tempos são esses,
Quando falar sobre flores é quase um crime,
Pois significa silenciar sobre tanta injustiça?
Aquele que cruza tranqüilamente a rua
estará por acaso inacessível aos amigos
Que se encontram necessitados?

É verdade: eu ainda ganho o bastante para viver.
Mas acreditem: é por acaso. Nada do que eu faço
Dá-me o direito de comer quando eu tenho fome.
Por enquanto estou sendo poupado.
(Mas se a minha sorte me deixa estou perdido!)

Dizem-me: come e bebe!
Fica feliz por teres o que tens!
Mas como é que posso comer e beber,
Se a comida que eu como, eu tiro de quem tem fome?
Se o copo de água que eu bebo, faz falta a quem tem sede?
Mas apesar disso, eu continuo comendo e bebendo.

Eu queria ser um sábio.
Nos livros antigos está escrito que a sabedoria
é manter-se afastado dos problemas do mundo
E passar o tempo que se tem para viver na terra sem medo;
Seguir seu caminho sem violência,
Pagar o mal com o bem,
Não satisfazer os desejos, mas esquecê-los.
Sabedoria é isso!
Mas eu não consigo agir assim.
É verdade, eu vivo em tempos sombrios!

II

Eu vim para a cidade na época da desordem,
Quando a fome reinava.
Eu vim para o convívio dos homens no tempo da revolta
E me revoltei ao lado deles.
Assim se passou o tempo
Que me foi dado viver sobre a terra.

Eu comi o meu pão no meio das batalhas,
Deitei-me entre os assassinos para dormir,
Fiz amor sem muita atenção
E não tive paciência com a natureza.
Assim se passou o tempo
Que me foi dado viver sobre a terra.

III

Vocês, que vão sobreviver às ondas
Em que nós perecemos, pensem melhor
Quando falarem das nossas fraquezas,
das quais vocês tiveram a sorte de escapar.

Nós vivemos a luta de classes.
Desesperados, trocamos mais de países do que de sapatos!
Só havia injustiça e não havia revolta.
Nós sabemos:
O ódio contra a baixeza
Também endurece!

Realmente, vivemos tempos muito sombrios!
A cólera contra a injustiça
Faz a voz ficar rouca!
Infelizmente, nós,
Que queríamos preparar o caminho para a amizade,
Não pudemos ser, nós mesmos, bons amigos.
Mas vocês, quando chegar o tempo
Em que o homem seja amigo do homem,
Pensem em nós
Com um pouco de compreensão.

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